Profissionais se tornam ativistas climáticos pensando nas futuras gerações
As gerações que nasceram no século passado estão mudando o funcionamento do planeta. Definitivamente. Mesmo depois do anúncio do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), o lançamento de gases de efeito estufa (GEEs) aumentou. Pior. A maior parte das emissões foi justamente depois disso. Ou seja, é bem provável que daqui uns anos, as crianças de hoje, adultos de amanhã, perguntarão: e vocês sabiam as consequências e mesmo assim ignoraram os alertas?
Quem acompanha a trajetória dos avanços e retrocessos das políticas ambientais sabe que estamos atravessando um período estressante. Tanto no Brasil, quanto no planeta. Esse foi um dos motivos que levaram dois profissionais que atuam na área ambiental, em frentes distintas, a fazerem algo para chamar a atenção de públicos diferentes dos que estavam acostumados a conviver.
Mariana Menezes, jornalista, que presta assessoria para empresas, é uma das fundadoras do movimento Famílias pelo Clima . Nilvo Silva, que tem uma larga experiência em órgãos de governo – foi presidente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) por duas vezes, diretor de licenciamento do Ibama e funcionário do Programa das Nações Unidas e Meio Ambiente no Quênia – está hoje escrevendo livros para crianças e adolescentes sobre as alterações do clima.
A conversa com os dois, na 16ª live Nas Ondas da Transição, no dia 9 de dezembro de 2021 rendeu muitos insights. Foi a estreia do anúncio do trabalho que Nilvo está realizado para a editora Elefante Letrado. Acompanho a trajetória do Nilvo desde que ele foi supervisor da Secretaria de Meio Ambiente de Porto Alegre. Li o seu primeiro livro “Mudamos o clima. E agora?”, e senti que essa iniciativa é um caminho para chamar a atenção de pessoas fora da bolha ambiental e sensibilizar, através de crianças, os mais velhos. Ele percebeu que não bastava mais só atuar com o seu trabalho técnico, como consultor, atual prestador de serviços da Fundação Getúlio Vargas.
Mariana conta que despertou para o problema quando morou em uma cidade no interior do Texas, Estados Unidos. Ela foi para a terra do tio San logo depois da eleição de Trump. E depois de ter contato com o relatório do IPCC sentiu que não podia só acompanhar as notícias. Precisava agir. Em 2021, tornou-se fellow do Climate Parent Fellowship, das organizações Our Kids Climate e Parents for Future.
Mariana confessa que a vontade de fazer alguma coisa veio do desespero. “Eu tinha uma fé, que depois do Acordo de Paris as coisas iam dar certo. Acho que foi um pensamento ingênuo. Mas quando saiu o relatório especial do IPCC, aquele que falava que não podíamos subir a temperatura mais que um grau e meio de uma forma muito tangível e apontava as consequências disso, comecei a ler e estudar mais sobre isso. Daí fiquei apavorada”.
No início da conversa ela mostrou o vídeo que foi apresentado na Conferência das Partes, em Glasgow, em novembro deste ano. Ela esteve na COP26 e garante: o que as pessoas estão pedindo nas ruas, nos protestos é diferente do que foi debatido entre quatro paredes pelas lideranças mundiais. Ela acredita que as pessoas ainda encaram as mudanças climáticas como algo muito distante
“Quando você está numa posição de privilégio, acha que não será atingido. Quando você começa entender que as mudanças climáticas tem um impacto sistêmico na nossa vida, que não é só mais uma enchente um pouco mais forte, um furacão em um país longe do meu, entende que é muito maior que isso, que impacta na produção e no preço de alimentos, em migrações. Tudo isso gerou uma ansiedade muito grande dentro de mim. E aí percebi que estava tão preocupada com a educação dos meus filhos, em oferecer para eles uma boa escola, uma boa formação, que sejam boas pessoas, mas não estava pensando no mundo em que eles iam viver. Vai ser muito mais difícil para eles prosperarem. Quando você começa a entender que as futuras gerações serão muito mais afetadas, veio um alerta. Comecei a pensar no que eu poderia fazer de prático. E sair de uma posição passiva de só ler notícia e ficar me apavorando, o que realmente nos deixa doente e me colocar numa posição ativa, enquanto cidadã e mãe”, afirma a jornalista.
Nilvo lembra que as discussões a nível mundial sobre problemas socioambientais vem de muito tempo. Estratégias e planos de ação vem mudando de nome com o passar do tempo, como a Agenda 21, os Objetivos do Milênio.
“Só que agora estamos batendo em um certo teto físico, que é a questão das mudanças climáticas. Mas a agenda das mudanças climáticas é muito ampla, envolve muitos temas, como justiça, desigualdade, direitos humanos. Com as mudanças climáticas esses problemas tendem a se agravar. Para quem trabalha com o futuro, nas decisões que se toma hoje – um exemplo é a questão do licenciamento, onde falar do futuro é encarado quase como uma heresia, especialmente em grandes projetos, não podemos deixar de falar na proteção das crianças, nas futuras gerações,” observa Nilvo”.
Os dois tem filhos e abordaram vários lados sobre o tema. E eles lembraram que a cada dia mais gente está se dando por conta disso, especialmente na Europa. Nos países mais desenvolvidos, essa é uma pauta extremamente preocupante. E como os dois tem fortes vivências internacionais, eles estão aproveitando bem o inglês fluente para fazer conexões, pesquisarem e produzirem materiais e ações.
Uma das iniciativas da organização Famílias pelo Clima, que tem membros em diversos países, é uma ação contra o governo de São Paulo para impedir o financiamento de automóveis movidos a combustíveis fósseis, que descumpre a Política Estadual de Mudanças Climáticas. Clique aqui para conferir.
Dicas para compreender melhor o tema
Sobre a ansiedade, entre outros problemas de saúde mental provocados pelo agravamento das condições climática, clique aqui para conferir o artigo da Lancet: Vozes dos jovens sobre ansiedade climática, traição governamental e dano moral: um fenômeno global, um estudo com 10 mil jovens de 10 países.
Há um curso introdutório na plataforma da ONU sobre mudanças climáticas. É composto por seis módulos e disponibiliza informações básicas sobre o tema. Clique aqui
Na COP26, foi lançado o Manifesto pela educação climática COP26, clique aqui
Saiba mais sobre o movimento ESCOLAS PELO CLIMA EDUCAÇÃO E AÇÃO CLIMÁTICA
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