Cada um faz o que pode

Desde que agenda neoliberal se instalou no Estado, vários mecanismos de planejamento e proteção ambiental vem sendo desmontados

ma enxurrada? Um tsunami? Uma avalanche? Não! Um desastre climático com impacto sistêmico, que nos afeta por vários lados! Poderia abordar meandros tão sinuosos e complexos em que acabei nadando nos últimos dias…  Ainda bem, não me afoguei!
Uma conhecida pede ajuda pelo desaparecimento de um familiar. Colegas de veículos de outros estados pedem ajuda para indicação de fontes. Um amigo quer saber para onde encaminhar doações de roupas XXGG. Onde obter certas informações, se o sistema de todo governo do Estado está fora do ar? Onde achar botas, equipamentos de segurança para andar no meio da água e da lama? Como as pessoas estão lidando com tantas necessidades jamais pensadas? Como aplacar a ansiedade de aflitos em tempos de destruição?

Sigo fazendo perguntas. Estou entrevistando muitas pessoas para compreender melhor outros ângulos dessa tragédia anunciada. Publico links de algumas matérias que tenham feito, caso não tenha lido. Escrevi sobre voluntariado para o Extra Classe. Sobre os tantos projetos e consultorias técnicas que foram feitas e não foram aproveitadas, escrevi para a Agência Pública.

 

Uma enxurrada? Um tsunami? Uma avalanche? Não! Um desastre climático com impacto sistêmico, que nos afeta por vários lados! Poderia abordar meandros tão sinuosos e complexos em que acabei nadando nos últimos dias…  Ainda bem, não me afoguei!
Uma conhecida pede ajuda pelo desaparecimento de um familiar. Colegas de veículos de outros estados pedem ajuda para indicação de fontes. Um amigo quer saber para onde encaminhar doações de roupas XXGG. Onde obter certas informações, se o sistema de todo governo do Estado está fora do ar? Onde achar botas, equipamentos de segurança para andar no meio da água e da lama? Como as pessoas estão lidando com tantas necessidades jamais pensadas? Como aplacar a ansiedade de aflitos em tempos de destruição?

Sigo fazendo perguntas. Estou entrevistando muitas pessoas para compreender melhor outros ângulos dessa tragédia anunciada. Publico links de algumas matérias que tenham feito, caso não tenha lido. Escrevi sobre voluntariado para o Extra Classe. Sobre os tantos projetos e consultorias técnicas que foram feitas e não foram aproveitadas, escrevi para a Agência Pública.

Embora não tenha conseguido transitar entre as desgraças, tenho feito muitos contatos com colegas, conhecidos, fontes etc.

Por aqui, os grupos de WhatsApp borbulham, fervem de postagens. Nos grupos da Defesa Civil, no oficial do governo do Estado, o governador e o vice sempre figurando no seu melhor ângulo. No extraoficial da Defesa Civil, criado por jornalistas que já cobriam o desastre do ano passado, muitas trocas de informações. E, é claro, gente que tenta de qualquer jeito passar para frente desinformação. Nos spins do POA Inquieta, gente de todos os matizes, os que acham que ajudam compartilhando dezenas de cards, aqueles que só desovam mensagens e nunca trocam uma ideia e naqueles com amigas de longe, muita necessidade de saber como estão as coisas daqui.

COONLINE entre amigos

No final da tarde de quarta, dia 15, participei de um encontro no Zoom da turma da Nova COONLINE, como chama um dos articuladores do grupo, o jornalista José Antônio Vieira da Cunha. Ele e mais alguns “dinossauros” do jornalismo, que fizeram a história do Coojornal e de outras empresas relevantes do Estado, como Jorge Polydoro (Grupo Amanhã), Elmar Bones (do Já Editores), Geraldo Hasse, Eugênio Bortolon, entre outros, se encontram em uma sala do zoom toda quarta-feira para conversarem com alguém que possa explanar um pouco sobre algum assunto.

Foto da tela de encontro online de jornalistas que se chama Coonline. Trataram da ajuda para o Rio Grande do Sul.

A pauta dessa semana, naturalmente, foi sobre essa catástrofe que estamos vivendo. O convidado foi o professor de Geociências da UFRGS Rualdo Menegat. E ele, como um bom painelista, mostrou mapas, blocodiagramas, ilustrações do Atlas Ambiental de Porto Alegre, do qual foi o coordenador. Ele não só explicou as características peculiares da Região Metropolitana – Porto Alegre fica no ponto final de um delta, justamente do Jacuí, o maior tributário do Guaíba – como chamou a atenção sobre os significados dessa situação que está provocando um tremendo sofrimento para tanta gente.

Ele foi enfático em dizer que há anos, desde que a agenda neoliberal se instalou no Estado, vários mecanismos de planejamento e proteção ambiental vem sendo desmontados. Só para citar alguns: Fundação de Economia Estatística, Fundação Zoobotânica, Museu de Ciências Naturais etc., além do Departamento (municipal) de Esgotos Pluviais, extinto na administração anterior da capital gaúcha. Segundo ele, há uma perda de inteligência do nosso local, o que acaba gerando um sentimento de “impotência social”. Tudo isso revela uma desconstrução profunda, na qual tanto a prefeitura como o governo do Estado vêm operando.

Como cubro essa área há mais de 30 anos, já prestei serviços para diversos governos, inclusive estive na equipe que montou a Secretaria de Meio Ambiente do Estado, fui consultora de projetos do Ministério do Meio Ambiente e de algumas organizações da sociedade civil, infelizmente, concordo totalmente com os argumentos do professor Rualdo.

E o pior de tudo: as medidas que estão sendo anunciadas pelo governo do Estado, quanto pela prefeitura de Porto Alegre, seguem na mesma linha da desconstrução de estruturas estatais. O prefeito Sebastião Melo anunciou sem consulta prévia a contratação de uma empresa especializada em resolver problemas complexos, como o que aconteceu com o Katrina, em Nova Orleans. O Polydoro acrescentou que a empresa teve sucesso na negociação das dívidas da Editora Abril, reduziu em 90% a dívida da companhia (quem ficou prejudicado na história, eu não sei).

Já o governo do Estado continua ignorando os comitês de bacia, segue dando mais atenção para seus amigos empresários do que para o que tantos representantes da academia que vem chamando a atenção há anos sobre a necessidade de se respeitar as características do nosso ambiente.

O professor Rualdo acredita ser necessário um amplo movimento da sociedade civil, com o apoio de universidades para a implantação de programas potentes de tecnologias sociais. E aí me permito suspirar, erguer a cabeça e indago: por que não aproveitamos a energia e a boa vontade de tantos voluntários que arregaçaram as mangas para atenuar a dor que está deixando marcas no Rio Grande? Será que nosso Estado é tão marcado a ferro e fogo (seria um karma?) que nem o maior desastre climático da sua história vai fazer com que os interesses em favor do coletivo estejam acima do tempero ou da bebida?

Enquanto isso, prefiro procurar formas de acalentar no meu coração. Porque pelo menos tenho consciência tranquila. Faço o que posso para que os que me leem e assistem acordem para esse novo normal. Não tem volta. A crise climática é uma realidade e está cada vez mais evidente que o quanto mais não quisermos enxergá-la, pior ela vai ficar.

 

Foto da Capa: Reprodução de Redes Sociais

Leia mais textos de Sílvia Marcuzzo AQUI.

 

Texto originalmente publicado na SLER

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima