Congresso de jornalismo ambiental evidencia o empreendedorismo

Diante do contexto do fazer jornalismo ambiental em tempos tão complexos, a abertura foi com discursos desanimadores. Mas aos poucos, nuances de mudanças no ar começaram a ser disseminadas por quem não queria vibrar no mindset do desencanto. No final, o evento foi marcado por gotas de esperança. Quem ficou até as 19h de sábado no Unibes Cultural, experimentou trocar ideias de como sair mais animado do encontro.

Assim foi a sétima edição do Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, uma iniciativa que acompanho desde a primeira edição e que só foi realizada em São Paulo graças ao empenho do casal Dal Marcondes e Ana Maria Vasconcelos, da Agência Envolverde, e do colega Reinaldo Canto. Nesta edição, muitos estudantes de jornalismo de São Paulo acompanharam a programação.

Encerramento do encontro com Dal, Ana e todos colaboradores que trabalharam no evento. A assembleia da RBJA deste ano contou com a minha facilitação. Os colegas puderam conversar e debater em grupos menores que rumos gostariam que tomasse a RBJA.

Se para uns aquela receita do jornalismo que aprendemos na faculdade acabou, para outros, o momento é justamente de oportunidade para se falar da temática ambiental, que tem marcado presença em muitas manchetes ultimamente. Na roda que tratou da comunicação feita pelas organizações da sociedade civil, chegou-se a conclusão que nos últimos tempos se atingiu o recorde de solicitações de entrevistas e posicionamentos sobre as temáticas socioambientais.

Roda com jornalistas e representantes de ONGs que são fontes para a imprensa. Com participação do Engajamundo, Instituto Socioambiental, Projeto Saúde e Alegria, Iniciativa Verde e ClimaInfo. Mediação de Reinaldo Canto.

Mas a questão chave é: qual é a receita para se fazer um jornalismo sustentável (sobre diversos aspectos) para informar a tão necessária conjuntura socioambiental em tempos de agravamento do aquecimento global?

O jeito de consumir notícias mudou. O público mudou. Mas falta plasticidade aos jornalistas para se adaptarem aos novos tempos, visão do mercado e dos anunciantes sobre a importância do jornalismo para a democracia. Está difícil conseguir viver de jornalismo no Brasil e é muito fácil disseminar notícias falsas, mentirosas (fake news). E o fazer jornalismo, olho no olho, com checagem, pesquisa, nunca foi tão necessário.

Com o enxugamento dos quadros e com os talentos sendo substituídos por gente mais jovem , a única alternativa para os veteranos é empreender. Ou seja, antes se contava com uma estrutura preparada para fazer o trabalho, hoje é preciso providenciar tudo para realizar qualquer job.

Hoje é fundamental explicar o funcionamento de mecanismos da natureza e, ao mesmo tempo, conectar isso ao dia a dia das pessoas. Ainda mais em tempos de fake science (termo de ouvi no Congresso da boca do cientista Carlos Nobre), pois o próprio chefe da nação emite informações sem qualquer fundamento científico.

A presença de Ivanete Bandeira Cardozo, mais conhecida como Neidinha (em pé), coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, de Rondônia, foi outro ponto alto do Congresso. Ela denunciou a situação da TI Uru-eu-wau-wau vem sendo invadida por grileiros, que ameaçam de morte indígenas, ativistas que defendem seus direitos assegurados pela Constituição.

O desaprender como caminho

Além de novas matérias-primas para a receita de fazer o produto que contém a informação, o jeito de fazer também precisa ser repensado. Desaprendido. Nesse sentido, participei de uma oficina com a mestra Maria Zulmira de Souza, diretora da Planetária Soluções Sustentáveis, cocriadora da Jornada Reimaginando a Educação e da Unidiversidade das Kebradas, sobre Desaprendizagem. A idealizadora do Repórter Eco, da TV Cultura de São Paulo proporcionou a um seletíssimo grupo experiências para a desconstrução de certezas. Conversamos em duplas, exercitamos a escuta ativa, vivemos com intensidade o momento presente com empatia.

Só pra ter uma ideia, quando estive na Rio+20, a frase que mais me tocou no livro Desejável Mundo Novo, organizado pelaLala Deheinzelin, um divisor de águas na minha vida, foi essa:

“O analfabeto do século XXI não será aquele que não consegue ler e escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender, e reaprender.” Alvin Toffler

O desafio de empreender

Para cozinhar, é bom ter uma mesa, certo? Pois para ter um móvel, é preciso ir na floresta, cortar a árvore, fazer tábuas, transportar a matéria-prima até um centro de distribuição. Depois achar um bom marceneiro que faça o produto final e ainda encontrar uma boa loja para que seja vendida. (isso se for na Amazônia, pois só lá ainda se faz isso).

Ser empreendedor significa ter que dar conta de tudo isso, não só de fazer todos os móveis da cozinha, como ir atrás dos insumos (semear relações, plantar conexões, cuidar da lavoura e esperar crescer com muito zelo e cuidado), montar a receita e se preocupar muito como o produto que foi fabricado será distribuído. E ainda ter uma rede de relacionamento de atendimento ao cliente. Antes o jornalista de redação com carteira assinada só se preocupava em apurar e escrever, no máximo editar, fazer fotos.

Roda de Conversa: As novas narrativas do Meio Ambiente : Diversidade, raça e contextos periféricos, com a participação de Ronaldo Matos, cofundador do Desenrola e Não Me Enrola, Thiago Borges,
Fundador e integrante da Periferia em Movimento, e eu, mediado por Rachel Añon.

A desenvoltura feminina

No Congresso, tive contato com mulheres empreendedoras que estão dando um show de destreza nesse universo. Além das co-organizadoras do evento Rachel Añon, uma das fundadoras da PonteAponte, e Gisele Neuls, da Matiz Caboclo, conheci Mayra Rosa, que criou oCicloVivo. Ela é arquiteta e estudou na Austrália desenvolvimento sustentável. O portal foca em soluções, notícias positivas e evidencia o que as pessoas podem fazer para melhorar o meio ambiente com pequenas atitudes. Ela revela que a gestão das redes sociais é algo que necessita de estudo e dedicação. Mayra conta com parceiros em modelo revenue share para dar conta da tecnologia do site.

Paulina falando e Gisele anotando.

Na palestra de abertura, Paulina Chamorro, também afirmou o quanto é estratégico conhecer o público que se quer atingir e saber distribuir a produção. Paulina produz e apresenta o Vozes do Planeta Podcast, é colaboradora na National Geographic Brasil e co-fundadora da Liga das Mulheres pelos Oceanos. Ela ainda desenvolve projetos especiais e é uma ativista pela diminuição do consumo de plástico no Brasil.

Após a saída da Rádio Eldorado, do Grupo Estado, passou a desenvolver conteúdo para diferentes frentes dentro das áreas de conservação ambiental. Fez consultoria de conteúdo para redes sociais de ONGs, produz roteiros de documentários, trabalhou como produtora de campo da documentarista Celine Cousteau, traçou estratégias de comunicação para projetos. Ainda mantém o podcast Vozes do Planeta produzido semanalmente e distribuído em todos os replicadores de podcast na programação da Rádio Vozes. Paulina encontrou seu espaço e campo de atuação na produção de podcasts ajudando a criar e coproduzir para organizações como Greenpeace e WWF-Brasil.

Atua também atualmente como pesquisadora de dois documentários internacionais ligados a temática dos oceanos. Como co-fundadora da Liga das Mulheres pelos Oceanos, participa de eventos e fóruns internacionais para ajudar a construir uma comunicação mais eficiente e engajadora.

E faz tudo isso sozinha. Para conseguir dar conta, Paulina aprendeu a se organizar, a fazer planejamento, saber vender projetos e a encontrar oportunidades de financiamento para produção de conteúdo. E reforça: sem interferência das empresas ou fundações no resultado final. ¨Acompanho a evolução da comunicação. Ela é estratégia e não consequência em quase tudo. E hoje as redes sociais e outros canais agregadores nos permitem ver facilmente os resultados ou o direcionamento dos temas. Como comunicadores temos que entender como funcionam essas ferramentas ou minimamente ter curiosidade. O grande consumo da informação está no digital. E o meu interesse é encontrar linguagens que atraiam cada vez mais pessoas para a conservação, para o engajamento”.

“O tempo é agora. A emergência climática e o crescente desmatamento não nos permitem mais não nos envolvermos nisso. É isso que eu acredito,” Paulina Chamorro.

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