O momento de vida exige dar um basta aos lados que me fazem flanar entre os labirintos do acaso
Aprender a dizer não. Selecionar. Ter discernimento do que posso. Do que devo. Do tamanho das minhas unhas. Do tamanho dos meus dedos. Da largura das minhas mãos. Da extensão dos meus braços. Da minha envergadura. Ah, que desafio complicado. É hora de cuidar de mim.
Comecei este semestre o mestrado em Comunicação na PUCRS. Demanda muita energia. Estou com trabalhos que necessitam dedicação. E eu acostumada a estar disponível para os outros, acabo me ferrando. Adoro estar pronta a ajudar, a servir. Amo disseminar notícias, passar novidades para amigos. Fazer conexões, estar disposta sempre a atender às solicitações.
Só que agora, meu momento de vida exige dar um basta aos lados que me fazem flanar entre os labirintos do acaso. Especialmente quando as telas me abduzem e me desligam do cronos. Principalmente porque tenho tido gastos fixos altos e que preciso batalhar todo mês para pagar as contas. Ah, que situação incômoda.
Me convidam para entrar em mais um grupo de zap e eu não consegui negar. Me acionam para criar mais uma ação para de educação ambiental e eu com dor digo que não tenho como tocar.
Para muitos, tudo isso pode não ter sentido. Mas focar no que é importante e fundamental para o meu desenvolvimento é algo que me causa um desconforto mesclado com algo difícil de nominar. Preciso encarar de frente esse aperto no peito e afirmar, apontar o dedo para mim mesma: agora é tudo contigo. Ninguém pode fazer o que só a ti compete.
O coletivo não depende de mim. Não pode depender de mim. Cada vez que alguém me aciona para perguntar o que fazer quando uma árvore está sendo cortada, minha insignificância grita: viu? não tens o que fazer!!! Só que essa ânsia de achar que salvo alguma coisa é algo perturbador. Esfrega na minha cara que o mundo em volta está carente de gente se importe uns com os outros. É urgente, precisamos nos conectar, ajudar uns aos outros.
Só que no momento, preciso colocar primeiro a máscara de oxigênio em mim. Já perdi as contas de quantas vezes me senti mal porque não estou sendo responsável comigo mesma. A falta de regularidade para fazer exercícios é apenas uma face dessa ausência de compromisso comigo mesma.
Sim, o mundo vai continuar sem mim. Se não eu, quem vai cuidar de mim? Eu é que não terei como estar no páreo se o fígado não funcionar direito. Preciso estabelecer uma rotina, um percurso consciente sem olhar para o lado. Talvez precise de um tapa olho como alguns cavalos têm, para não desviar a cabeça. Ou quem sabe alguém com um chicote me ameaçando se eu sair da rota…
Ah, se não tivesse tantas alternativas, talvez fosse mais fácil seguir a trilha. Mas com tantos estímulos, grupos, iscas me chamando a atenção, é bem mais difícil. Será que a solução será dar um tempo em todos os lugares virtuais que não me remuneram? Sei que vou precisar mudar radicalmente meu modus operandi para conseguir cumprir com as metas e as entregas.
Esse texto é um desabafo de uma imigrante digital que tem incontáveis atrativos para desviar a atenção. Trabalha, estuda, agiliza coisas tudo na própria casa. E que por muito tempo achou que outros poderiam resolver seus problemas, suas angústias. Tenho mais de 50 e nunca fui de jogar a toalha. Mas, também, inúmeras vezes nem tentei com medo de não conseguir. Isso gera uma sensação de que o compromisso comigo mesma é inadiável.
Agora vou ter que dar um ponto final. Tenho que terminar um texto, fazer duas resenhas e uma apresentação. Agradeço às queridas leitoras e demandantes se puderem me dar uma força nessa fase. Não me deixem cair em tentação. Amém.
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Texto originalmente publicado na SLER