Os rastros da enxurrada e da escassez da chuva

Temos mais de 10 milhões de brasileiros vivendo em áreas de risco. E o que os governos estão fazendo a respeito?

O tema pode ser encarado como indigesto. Mas, não tem como não falar das consequências já sentidas das mudanças climáticas. Tanta chuva em São Paulo. Estiagem severa por aqui. E, no Rio Grande do Sul, os governos do estado e dos municípios parecem que não estão preocupados com a mitigação e a adaptação às alterações do clima. Clique aqui e veja esse site que mostra o quanto as temperaturas têm sido muito mais altas nos últimos anos. O link vai dar no RS, mas dá para consultar outros estados e qualquer outro país do globo. Esse site mostra as anomalias de temperatura pra cada região do planeta. E converte algo complexo em algo lindo (as famosas listras).

O querido André Trigueiro em seus canais (o que mais gosto e acompanho é o Papo das 9, se você não conhece, vale demais conferir) tem tocado nessa tecla há tempo. Ele chama atenção: ‘Jamais se viu tanto volume de chuva acima da média em São Paulo”. Trigueiro usa os dados do Cemaden. O Cemaden avisou o governo paulista e as prefeituras dias antes sobre o risco que as populações corriam (leia o G1 aqui). Tudo a ver com justiça climática. A desigualdade social é escrachada numa hora dessas. Nada foi feito para retirar as pessoas do local antes das tragédias.

Não tem como não associar ao filme Não Olhe para Cima. Tragédia anunciada.

Estamos vivendo um momento da história em que desastres desse tipo estão cada vez mais frequentes. É o maior desafio da humanidade de todos os tempos: reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs). Pois isso tem íntima relação com nossos hábitos, nossa cultura de consumo. Até o momento o quadro só tem piorado. O mundo está cada vez mais quente. Os países não estão conseguindo se entender e cortar suas emissões (leia-se cumprimento do Acordo de Paris).

Sim, o assunto é complicado. E não quero que você corte os pulsos, prezado leitor, estimada leitora. Só que cada nova notícia, pesquisa ou desastre indica o quanto precisamos mudar de rumo, como caetaneou o nosso ilustre músico da Bahia: ‘alguma coisa está fora da ordem, fora da ordem mundial”.

Temos mais de 10 milhões de brasileiros vivendo em área de risco. Quem não tem condições de adquirir um lote em um local seguro, vai para onde? Veja a notícia aqui com dados de 2010.

Mas o que governos fazem? Não sei a resposta e sugiro que você pergunte para os tomadores de decisão que conhece. Os caras que estão mandando na maior parte dos municípios são homens brancos com cabeça do século passado. E que nem sabem o que faz o Cemaden, em boa parte dos casos (aliás, vale perguntar para o seu prefeito ou vereador conhecem).

Escrevo essas linhas desabando. Sim, é muito duro acompanhar as notícias ambientais. Eu que acompanho há quase 30 anos esse tema, já vi muitas políticas públicas, projetos incríveis ir por água abaixo porque os governantes não consideram os impactos de longo prazo dos problemas socioambientais.

Água demais no Sudeste e de menos no Sul

Mas se no Sudeste o problema é muita água, no estado detentor do Pampa a falta do precioso líquido está promovendo muito estrago. E vai impactar a vida de muita gente. Não matando diretamente as pessoas. Mas provocando alta em muitos insumos. Só para ter uma ideia, conforme dados da Rede Técnica Cooperativa (RTC/CCGL) vamos ter prejuízos expressivos este ano. Saiba mais aqui.

A quebra da safra de milho já é de 56% e a estimada para soja é de 43%. Isso representa um mega impacto no setor. Grana que deixa de circular. Aumento dos preços de inúmeros produtos feitos com essas matérias-primas. Mesmo que você não se interesse, não tenha noção de tudo isso (quem vive na Capital ou em grandes centros perde a noção de determinadas coisas), o seu bolso será afetado. Os climatologistas vêm dizendo que vamos sofrer com situações como essa há tempos.

A ausência de chuva também promove outras situações que deveriam promover a reflexão sobre o rumo da execução de políticas públicas. O caso dos trocentos quilos de resíduos (pois o peso estimado da montanha é de 1,2 tonelada) no rio Gravataí é emblemático. Decorrência do baixíssimo fluxo desse afluente do Guaíba, incontáveis resíduos ficaram trancados promovendo um cenário desesperador. Lá estavam (ou estão ainda, pois vai demorar para fazerem a limpeza) todo o tipo de resíduo, que poderia ter sido reaproveitado ou enviado para a reciclagem (geraria renda para dezenas de famílias). Mas não. Agora, todo o monte virou rejeito. Vamos ter que pagar pela limpeza do rio. E o destino será um aterro sanitário (ou seja, ainda vamos ter que pagar para o transporte e a destinação final).

Todos saem perdendo com as situações citadas. Tanto os desabamentos que ceifaram dezenas de vidas, quanto a quebra de safras e o lixo acumulado no Gravataí. Tudo por quê? Por ausência de educação ambiental (que deveria ser permanente, inclusive nas Câmaras de Vereadores), de educação climática? O clima está mudando, e as prefeituras, os governos precisam estar ligados. Quem dá as tintas (boa parte da paleta de cores) hoje é o clima. É uma emergência trabalhar em direção do planejamento, na precaução de riscos. É melhor evitar, do que remediar, diz o ditado.

Por fim, te convido a conferir a postagem do ClimaInfoUma provocação. Pois sem combate às mudanças climáticas, a humanidade, a natureza, o futuro e a vida sangram, choram e morrem. Minha solidariedade às famílias enlutadas de São Paulo, aos milhares de agricultores que estão sendo prejudicados e a você (se mora no RS) que vai ter que pagar por tudo que acarreta a limpeza do rio Gravataí.

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