Governantes precisam se preparar para a crise climática

Estamos sentindo na pele o que representa o aumento da frequência de eventos extremos

É melhor prevenir e festejar que não aconteceu nada do que ignorar e ocorrer uma tragédia. Essa é a máxima para muitos norte-americanos, onde é comum a ocorrência de furacões, tornados, eventos extremos em geral. Nos últimos dias, muitos alertas foram dados em decorrência da passagem de um ciclone no Rio Grande do Sul. Só que avisar apenas não basta. Muitos estragos, prejuízos e ameaças à vida de milhões de pessoas têm nos rondado.

Não vejo a hora de que caia a ficha, digo, o orelhão mesmo, dos tomadores de decisão quanto a realidade de encarar a crise climática com responsabilidade. Chega de só culpar a natureza! É pra ontem a necessidade dos legisladores, chefes do executivo, donos do poder investirem em medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. No RS, parece que os prefeitos vivem em um mundo paralelo. Não conectam o que acontece nos seus municípios com o que está ocorrendo em outras partes do planeta. Diversos pesquisadores vêm alertando há tempo que os eventos extremos serão cada vez mais frequentes nos estados do sul do Brasil.

Será que já calcularam os prejuízos que causam as tantas horas sem energia elétrica à população? Esperar que os governos se mexam na velocidade que o clima exige pode causar muita decepção. Então, como não vejo nos meios de comunicação de massa (pelo menos no RS) darem informações sobre o que está rolando em outros lugares com relação ao tema, trago aqui algumas informações levantadas pelo ClimaInfo nessa semana.

Água demais causa mortes e estragos

Não é só nos estados do sul do Brasil que choveu cântaros. Aliás, em outras partes do mundo está caindo tanta água, que os efeitos estão sendo considerados imprevisíveis e mortais, alertam cientistas.  Entre no link do jornal The Guardian. Ali dá para ter um resumo em vídeo com os efeitos das chuvas torrenciais em vários cantos do planeta.

Tempestades inundaram cidades e causaram grandes danos no vale do Hudson, nos Estados Unidos. Na China, milhares de pessoas foram deslocadas. Na Espanha, foram vistas pessoas agarradas a seus carros e subindo em árvores para escapar da enchente. No Norte da Índia, deslizamentos de terra bloquearam 700 estradas e as enchentes provocaram dezenas de mortes. No Japão, até quarta dessa semana, três pessoas morreram e outras três estão desaparecidas devido a inundações. Rios transbordaram e encostas desmoronaram com quantidades recordes de água na ilha de Kyushu.

Vale lembrar que o excesso de água trouxe problemas no Nordeste do Brasil! Causaram destruição em Alagoas e Pernambuco. Mais de 3O municípios foram afetados com quase cinco mil desabrigados. E aí acontece aquele efeito cascata: falta energia elétrica, o abastecimento das cidades fica comprometido, prejuízo para todos os lados.

Altas temperaturas no Hemisfério Norte

Na Europa, conforme informa o jornal Valor do dia 13 de julho, “os primeiros dias do mês registraram uma sequência de quatro dias de recordes históricos de temperaturas. O aquecimento global, como previsto, está se acentuando, e junho foi o mês mais quente da história, segundo o Copernicus Climate Change Service, agência europeia. As temperaturas subiram 0,5 C acima da média de três décadas, 1991-2020. Os cientistas advertem que os efeitos dos gases de efeito estufa podem estar diminuindo a distância entre um El Niño e outro”.

As consequências da crise climáticas são difíceis de computar. Mas já dá pra saber algumas coisas. Um estudo publicado pela revista Nature aponta que mais de 61 mil mortes foram causadas pelas altas temperaturas que castigaram a Europa no verão do ano passado. Os pesquisadores examinaram os números oficiais de mortalidade de 35 países europeus e encontraram um aumento acentuado de mortes entre o final de maio e o início de setembro de 2022, em comparação com a média registrada em um período de 30 anos. O aumento de mortes relacionadas ao calor foi maior entre pessoas mais velhas, mulheres e em países mediterrâneos. A taxa de mortalidade foi mais alta na Itália, Grécia, Espanha e em Portugal.

A temperaturas acima de 45°C levou a Sociedade Meteorológica Italiana chamar a onda como “Cerberus”, monstro de três cabeças que aparece no Inferno de Dante como um guarda dos portões do inferno. “A terra está com febre alta e a Itália está sentindo isso em primeira mão”, disse Luca Mercalli, chefe da Sociedade Meteorológica Italiana. Espanha e Portugal também registraram máximas diárias na casa dos 30°C por mais de uma semana, sendo que em partes do sul, ultrapassou 40°C.
Os cientistas destacam a necessidade de os governos abordarem os impactos do aquecimento global na saúde das pessoas. Agora imagina noites acima de 30°C e 87% de umidade, sem energia por umas 16 horas por dia, ou seja, sem ventilador e ar-condicionado? Veja o relato feito por Leila Salim no Observatório do Clima. Ela conta o que passou no Líbano.

Tudo está interligado

Creio que já deu para perceber que tudo se relaciona ao clima. Saúde, infraestrutura, agricultura, consumo, fome, mortalidade e muito mais. E é por isso e também, arrisco em escrever, que devido ao sistema capitalista pior que selvagem que vivemos, talvez seja mais fácil a natureza dar o troco ao Homo sapiens, do que as lideranças mundiais se empenharem em reduzir a emissão de gases de efeito estufa (como prevê a assinatura do Acordo de Paris). Sem uma ação concertada dos 10 países mais poluidores, que concentram dois terços das emissões, o aquecimento não será contido. E como saiu recentemente no jornal Valor, “as Conferências das Partes (COPs), onde 190 países debatem e decidem sobre o assunto, têm um processo de deliberação e execução moroso demais diante da urgência das mudanças climáticas”.

Se as organizações da sociedade civil, as entidades e empresas que defendem a vida acima do lucro não se mobilizarem, será cada vez mais difícil darmos uma ré em direção ao ponto de não retorno. Talvez o primeiro passo seja que as pessoas que se importam com os outros, mesmo com as que nem nasceram, tenham a informação do que isso representa.

Confesso que me dá uma agonia a cada notícia lida com as declarações do secretário geral da ONU, António Guterres. Ele afirmou recentemente que “as mudanças climáticas estão fora de controle”. Todas as épocas da História das civilizações foram permeadas de guerras, desrespeitos, hostilidades. O momento atual talvez seja um dos mais desafiadores, porque mexe com tudo que fomos empurrando para debaixo do tapete ao longo do tempo. E isso em vários cantos do mundo. E está tudo interligado.

Procuro estar com a consciência leve, de que estou fazendo o que está ao meu alcance em meio a esse caos. Pelo menos minha profissão, minhas atitudes não colocam mais lenha nessa fogueira. Acredito que isso já é um caminho. Ser artivista (artista+ativista), disseminar informações, conectar pessoas que podem melhorar o mundo são alguns propósitos da minha vida. Precisamos cultivar a paz de espírito, apesar de tudo. Isso não é algo novo. Religiões, filosofias entre outros jeitos de ver o mundo já vem apontando isso há muito tempo. Sigamos.

Pensar global, agir local

Por tudo isso e muito mais, que lhe faço um convite. Precisamos nos inteirar dos riscos que correm as áreas verdes perto da nossa casa. No meu caso, o Parque Marinha do Brasil, aonde vou com frequência, há planos da prefeitura de Porto Alegre entregá-lo à iniciativa privada. Só que já temos visto e constatado o pouco apreço da atual administração às árvores e ao verde da cidade. Além disso, o que está acontecendo com o Parque da Harmonia, que teve sua área quase que toda descaracterizada, com o corte de árvores e a destruição de um lago de contenção, exemplifica bem o risco que o Marinha corre. Uma das medidas mais importantes de enfrentamento às mudanças climáticas é justamente o plantio e a manutenção de locais como o Marinha. Ainda mais em uma cidade que sofre com as altas temperaturas no verão.

Participe da caminhada que estamos organizando no próximo sábado, dia 15 de julho, às 9h30 (ponto de encontro no Trend, esquina das avenidas Ipiranga e Borges de Medeiros). Os arquitetos Ivan Mizoguchi e Rogério Malinsky, planejadores do parque, estarão conosco contando como foi a execução do projeto e as mudanças que aconteceram nos últimos anos. A promoção envolve várias organizações: coletivo POA Inquieta, do qual sou articuladora, Agapan, IAB, TransLAB.URB, Atua POA, coletivos Preserva Redenção e Preserva Marinha.

Foto da Capa: Prefeitura de Porto Alegre

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